quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Coluna Política: Música e voto nas eleições municipais

Nada é mais marcante em uma campanha eleitoral municipal, sobretudo pelos interiores Brasil a dentro, do que as músicas das campanhas. Basta puxar pela memória para logo se perceber que pelo menos um ou dois jingles de campanhas passadas estão bem vivos na mente.
Quase sempre as músicas de campanha são produzidas tendo por base algum sucesso do momento, ou de um clássico consagrado. As vezes até mesmo a música é usada na íntegra, na sua forma original, como hit de campanha que embala e empolga a militância de um partido ou candidato na frenética busca do voto.
Mas, uma pergunta sempre ficou no ar: e os direitos autorais dos autores ou intérpretes da música, como ficam? A resposta, até pouco tempo também era clara: não ficam!
Contudo, após rodada de audiências públicas promovidas pelo Tribal Superior Eleitoral, a nova resolução 23.732/2024/TSE, fortemente influenciada nesse aspecto por artistas como Marisa Monte e Paula Lima, vetou o uso de músicas dos repertórios dos artistas para produção de paródias que são transformadas em jingles eleitorais. O art. 23-A e parágrafos da resolução possibilita aos artistas e detentores dos direitos autorais da produção artística notificar o candidato ou partido para que haja imediata cessação de utilização da sua obra para fins eleitorais.
Na base dessa questão está um argumento trazido ao debate pela cantora Marisa Monte, qual seja: o de que, para além da questão dos direitos autorais, está em jogo também o direito moral do artista que, muitas vezes é constrangido ao ver a sua música sendo usada para alavancar candidaturas que defendem ideias e representam projetos, modelos e visões de mundo opostas as que o cidadão-artista defende e acredita.
Sem instrumentos para coibir essa prática, o artista fica submetido, nas palavras da cantora Marissa Monte, a “Uma tortura moral, psicológica…”. Em uma das suas falas nas audiências, disse Marisa: “venho aqui expressar essa preocupação da classe. A nossa sugestão é que seja direito do autor impedir que sua obra seja usada através de paródia em jingles eleitorais”.
Provocado pela classe artística nas audiências públicas por ele mesmo convocadas, o TSE editou a aludida resolução que será uma das que regulamentará as eleições municipais de outubro, impondo, assim, atenção redobrada das coordenações e assessorias jurídicas das campanhas, seja para o Executivo ou para o Legislativo municipal.
Ademais, com a recentíssima decisão do STF, que negou o recurso do ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, João Dória, o político terá que pagar uma indenização de 103 mil reais aos artistas Marisa Monte e Arnaldo Antunes pela utilização não autorizada, com fins políticos, da música Ainda Bem (Álbum: O Que Você Quer Saber de Verdade, 2011), a questão torna-se ainda mais relevante, pois além do desgaste eleitoral de ter ordem judicial retirando de circulação um jingle de campanha produzido ilegalmente, o uso de tal prática, já tão corriqueira e consolidada na cultura eleitoral brasileira, pode gerar processos com indenizações de valor elevado a serem pagas pelos candidatos e partidos.
Talvez pelo caráter de novidade da recente resolução do TSE ainda não haja o cuidado necessário por parte das coordenações de campanhas, já que é possível observar, sobretudo nas redes sociais, pré-campanhas usando músicas de vários artistas na ilustração das postagens destinadas a sua divulgação.
Mas, atenção! As regras do jogo para as eleições de outubro no que se refere aos jingles de campanha já estão dadas pelo TSE, devendo as assessorias das campanhas, sobretudo as jurídicas, conhecê-las e observá-las à risca, evitando, assim, transtornos políticos, estratégicos e financeiros.
Que a nova resolução possibilite um bom uso da arte na arte da política!
*Isaac Luna é advogado, cientista político, professor universitário e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político – ABRADEP.

 

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